“É lamentável o acontecido”, disse o secretário-geral da CNBB, dom Dimas Lara Barbosa, a respeito do abuso sexual sofrido pela menina de nove anos em Alagoinhas, que ficou grávida de gêmeos e abortou. “Mais lamentável ainda é o fato de que não se trata de um caso isolado. Infelizmente, temos no Brasil inúmeras denúncias de exploração sexual e até de tráfico de crianças. Alguns dos nossos bispos estão sendo ameaçados no Pará por denunciar esse tipo de prática de exploração contra crianças e adolescentes”, lembrou o bispo durante entrevista coletiva à imprensa realizada hoje, na sede da CNBB, em Brasília, na qual estiveram presentes o presidente, vice-presidente e o assessor de Direito Canônico, respectivamente, dom Geraldo Lyrio Rocha, dom Luiz Soares e padre Enrique Pujol.
Para dom Dimas, esses casos de violência contra crianças e adolescentes lembram a Campanha da Fraternidade deste ano que traz como tema “Fraternidade e Segurança Pública”. “A Campanha da Fraternidade aponta a violência doméstica como um fator de insegurança”, disse.
Excomunhão
Para, dom Geraldo Lyrio Rocha, não se pode reduzir a violência ocorrida com a menina de Alagoinha à questão da excomunhão. Ele lembrou que a nota da CNBB, divulgada na sexta-feira da semana passada, manifesta, em primeiro lugar, solidariedade à família da criança que está passando por um constrangimento enorme e condena o estuprador que deve pagar pelo crime segundo a justiça.
“Eu fico pensando na situação da mãe desta criança e nos demais familiares. É um enorme sofrimento, uma humilhação ter uma criança sendo explorada sexualmente pelo padrasto desde os seis anos de idade. Isto é uma coisa repugnante e me causa estranheza que este aspecto tão repugnante tenha se diluído diante da história da excomunhão, que precisa, sim, ser tratada. Porém reduzir uma problemática deste porte unicamente ao episódio da história da excomunhão é esvaziar uma questão sobre a qual a consciência nacional precisa ser despertada”, disse.
Segundo dom Geraldo, excomunhão não é sinônimo de condenação ao inferno, mas trata-se de um ato disciplinar da Igreja. “A excomunhão existe para chamar atenção para a gravidade do ato. O aborto traz consigo essa pena porque está se diluindo a gravidade do aborto até mesmo entre os cristãos. Quem viola isto, se coloca fora da comunidade eclesial”, esclareceu.
Ainda de acordo com o presidente da CNBB, o estupro não é penalizado com a excomunhão porque todos já têm consciência de que se trata de um ato repugnante. “O estupro é uma coisa tão repugnante que a Igreja não precisa chamar a atenção para ele, está na consciência de todos. O aborto não, por isso a excomunhão não é só para punir, mas para que quem praticou o ato possa perceber a gravidade e buscar sua reconciliação”, afirmou dom Geraldo.
Para dom Dimas, o arcebispo dom José Cardoso Sobrinho “não excomungou ninguém”, apenas lembrou uma norma que existe no Direito Canônico. “Em alguns casos especiais se prevê este tipo de pena, como por exemplo, a profanação do Santíssimo Sacramento, ou o caso do padre que revela um segredo de confissão, em que a pessoa, pelo simples fato de cometer este tipo de ato, se coloca fora da comunhão da Igreja”, explicou. É a chamada excomunhão latae sententiae.
O presidente da CNBB concorda com dom Dimas. “Na verdade, o arcebispo não excomungou ninguém. Ele anunciou que este tipo de ato traz consigo tal possibilidade, de acordo com o que prevê o Código de Direito Canônico”, esclareceu.
Dom Dimas disse que, para incorrer em excomunhão, a pessoa precisa ter consciência da gravidade do ato e liberdade para praticá-lo. “Em qualquer tipo de pecado existem as circunstâncias. Uma coisa é a pessoa agir deliberadamente contra o outro. Outra coisa é a pessoa agir sob pressão ou sob efeito da droga, por exemplo. Neste sentido existe uma previsão no Código de Direito Canônico, considerando a gravidade do aborto, de que as pessoas que trabalham contra o nascituro, consciente e livremente, se colocam fora da Igreja, porque já não comungam com o pensamento cristão que é a defesa da vida”.
Para dom Dimas, a Igreja considera o aborto um ato grave, sobretudo por aqueles que o praticam conscientemente. “Os que praticam o aborto com consciência e as clínicas de aborto não estão em comunhão com o pensamento cristão em defesa da vida”, recordou.
O secretário deixou claro também que a criança violentada não incorreu em excomunhão. “Eu acredito que a mãe dela também não [incorreu na excomunhão] porque ela agiu sob pressão”, disse.