O mês de janeiro vai chegando ao fim, mas uma das mensagens que estes primeiros dias do ano destacam é a necessidade de cuidar da saúde mental. Essa é a indicação que surge da campanha Janeiro Branco. A iniciativa é realizada nacionalmente desde 2014 e ocorre no primeiro mês do ano pois é quando, tradicionalmente, as pessoas se voltam para uma realidade mais reflexiva, propondo metas, perspectivas e mudanças para o novo ano.
“O Janeiro Branco traz esse ponto de partida, que lembra uma folha branca que não há nada escrito como um recomeço, um começo. Há ali, diante dessa folha branca, muitas possibilidades de ação. Esse traçar metas, objetivos, esse novo, esse cuidado consigo“, explica a psicóloga Silvana Elisa Kloeckner Guimarães, leiga consagrada na Comunidade Paz & Mel, em Dois Irmãos, diocese de Novo Hamburgo (RS).
Integralidade
Silvana destaca o objetivo da campanha, que assim como outras no decorrer do ano, traz para a população a necessidade de cuidado. “A campanha busca incentivar esse cuidado da saúde mental, que é tão importante nessa perspectiva da integralidade, de que nós somos pessoas inteiras – a nossa realidade emocional, psíquica, mental nos compõe – e nós precisamos cuidar dela”.
Nesse sentido, há a necessidade de cuidar de todas as dimensões da vida, como a dimensão física, biológica, a dimensão espiritual, de fé, a formação de fé, o cuidado da alma, da afetividade, a parte cognitiva. “Cuidar das outras dimensões é importante, mas não tira a necessidade de cuidar da saúde mental”, salienta.
Às vezes, a excessiva atenção a uma dimensão em detrimento da outra pode ser prejudicial, mesmo quando se fala da dimensão espiritual. “Eu gosto de dizer sempre que nós não somos anjos, não podemos cuidar só da dimensão espiritual, nós temos um corpo para ser cuidado e nós temos a dimensão psicológica, mental para ser cuidada e que tanto é importante”, ressalta Silvana.
Para a psicóloga, que é especialista em Psicologia Clínica, o cuidado com a saúde mental possibilita a consciência de si, o autoconhecimento, “não sermos alienados de nós mesmos”. Isso “nos ajuda a enfrentar as situações diversas que a gente vive no dia-a-dia e que são tão difíceis. Mas, estando bem conosco, inteiros, apropriados de si, conseguimos lidar com mais serenidade e mais equilíbrio e mais harmonia as nossas exigências”.
Igreja no cuidado da saúde mental
A Igreja, no seu serviço de promoção integral da pessoa humana, para que todos tenham vida, também está atenta à necessidade de cuidado da saúde mental. O Papa Francisco, na sua mensagem para o 56º Dia Mundial das Comunicações, aborda o tema Escutar com o ouvido do coração e partilha uma história de um “médico ilustre, habituado a cuidar das feridas da alma”. A ele foi perguntada qual era a maior necessidade dos seres humanos. A resposta foi «O desejo ilimitado de ser ouvidos».
Francisco também ressalta que “das páginas bíblicas aprendemos que a escuta não significa apenas uma percepção acústica, mas está essencialmente ligada à relação dialogal entre Deus e a humanidade”.
Essa abordagem revela uma atenção da Igreja com a atenção para aquilo que as pessoas trazem dentro de si. Na prática, surgem programas, projetos e ações pastorais ligadas à escuta, como a já presente em diversas partes do Brasil “escuta ativa”.
“Essa escuta do outro é também um dos cuidados de saúde, enquanto que tantas vezes, na verdade, as pessoas precisam de alguém que escute, que pare para escutar, porque realmente falar do que se vive, falar dos sentimentos, é falar de si. E receber esse cuidado é também uma ajuda, um caminho de saúde“, destaca Silvana.
Oferecidos por grupos voltados para o cuidado da dimensão psicológica, da saúde mental e por profissionais que facilitam o acesso aos atendimentos, os serviços de escuta prestam “uma imensa ajuda para as pessoas nos seus sofrimentos variados”, conta a psicóloga, que lista alguns deles: angústias, dores, problemas de diversas ordens, ansiedade, depressão, problemas com drogadição, relações abusivas, problemas de autoimagem, autoestima, dificuldades variadas de expressão, de vergonha, as questões de automutilação, risco de suicídio. “São vários os sofrimentos pelos quais as pessoas passam na vida, diversas situações e que precisam de acolhida, de escuta. Então esses serviços são essenciais para o cuidado do outro”.
Silvana Kloeckner conta que são várias as ações, de congregações, profissionais que se dispõem, institutos, hospitais na oferta de serviços, às vezes nas paróquias, agindo na direção de acolhida e ajuda às pessoas. Estas, por sua vez, podem se beneficiar com mais saúde, melhorarem a vida ao seu redor e aí oferecerem ajuda para outras pessoas também.
A atuação dos profissionais
Orientações, assessoria, palestras, oficinas e até o próprio serviço clínico num valor mais acessível são algumas das formas que os profissionais ligados à saúde mental tem ajudado na Igreja. Ao se disporem, “os profissionais vão promovendo o cuidado da saúde mental das pessoas e ajudando na qualidade de vida, na integração fé e dimensão psicológica”, ressalta Silvana.
Ela partilha algumas das iniciativas que existem em todo o país, dentro da Igreja, envolvendo ações multidisciplinares de saúde, educação a assistência que buscam o cuidado e a promoção da saúde mental. Silvana orienta, no entanto, que tais serviços sejam procurados na própria diocese para ver o que é oferecido.
- Em São Paulo, conheço o Instituto Acolher, que presta vários serviços de saúde mental e formação humana.
- Em Curitiba, tem o Instituto de Aconselhamento e Terapia do Sentido de Ser – IATES, que oferece cursos, palestras e atendimentos.
- Na Arquidiocese de Porto Alegre (RS) existe, há alguns anos, um grupo de estudos de formação humana, do qual eu faço parte, que é composto por profissionais e estudantes da saúde e da educação, juntamente com o padre Talis Pagot, um diácono e um seminarista, e que visa estudar, trocar e promover assuntos de integração de formação humana-cristã, incluindo a saúde mental. Os profissionais já realizaram algumas palestras nesse sentido, e prestam serviços de forma privada à população em geral e aos membros da Igreja, incluindo sacerdotes, seminaristas, religiosos e leigos engajados em diversos movimentos e pastorais.
- Há o serviço “Casa de Escuta“, voltado para acolher pessoas em situação de luto, desenvolvido pela Comunidade Nos Passos do Mestre, em Porto Alegre.
- Na diocese de Novo Hamburgo, existe o Projeto Café e Razão, formado por jovens leigos, sob a orientação espiritual do Pe. Elton Vinícius Mayer, que tem realizado diversos eventos com debates em diferentes áreas do conhecimento, à luz da fé católica. Dentre os temas abordados, estão os de saúde mental, já tendo sido trabalhado assuntos como depressão e psicoterapia, por exemplo.
- Na paróquia da Santo Afonso, há um serviço realizado por uma psicóloga, que atende por um valor social, facilitando o acesso ao atendimento psicológico.
A campanha
A Campanha Janeiro Branco convida a humanidade a cuidar das saúdes mentais e emocionais dos indivíduos e das instituições sociais. Nascida em Janeiro de 2014, em Uberlândia(MG), a Campanha Janeiro Branco espalhou-se por todo o Brasil e alguns outros países do mundo, como Angola, Japão, Colômbia, Estados Unidos, Portugal e Holanda.
No Brasil, virou Lei Municipal e Lei Estadual ao longo dos últimos anos, estabelecendo, simbólica e oficialmente, o mês de Janeiro como o mês da Saúde Mental em vários municípios e estados do país.
Saiba mais: https://janeirobranco.com.br/