Nós da Comissão de Bioética e Defesa da Vida da Arquidiocese de Campinas, queremos manifestar nosso repúdio ao posicionamento do Conselho Federal de Medicina sobre o Aborto.
Em primeiro lugar, embora o texto frise “que não se decidiu serem os Conselhos de Medicina favoráveis ao aborto, mas, sim, à autonomia da mulher e do médico” essa afirmação é apenas um jogo de palavras e esconde a verdadeira intenção, pois se são favoráveis à autonomia da mulher e do médico a praticar o aborto, estão, sim, sendo favoráveis ao aborto.
Em segundo lugar, a afirmação de que “Espera-se… qualificar o exercício da Medicina e melhorar a qualidade da assistência em saúde oferecida aos brasileiros” é uma falácia, pois a causa excludente de ilicitude proposta, qual seja, se “por vontade da gestante até a 12ª semana da gestação”, não configura uma prática terapêutica, e o ato proposto não tem por objetivo melhorar a qualidade de assistência em saúde pois, não obstante qualquer eufemismo que se possa usar, o aborto é indiscutivelmente um ato que vai levar à morte um ser humano o qual também deveria ser protegido.
O CFM não só não está melhorando a assistência em saúde (assassinato deliberado não pode ser classificado de assistência em saúde), como fere vários artigos do próprio Código de
Ética Médica que afirma em seu preâmbulo que o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e ética. Também diz o código de ética que é vedado ao médico praticar atos médicos desnecessários ou proibidos pela legislação bem como é vedado ao médico discriminar o ser humano, atentar contra sua dignidade ou usar a profissão para favorecer o crime.
A prática do aborto não pode ser considerada ética porque não está a serviço da saúde, pois causa deliberadamente a morte de um ser humano que é discriminado por ser mais vulnerável no estágio de vida intra-uterina e ainda põe em risco a vida da mãe.
O conselho ainda apresenta como motivo para o aborto, mal formações na criança, configurando a prática da eugenia.
Ainda afirma o conselho que os atuais limites excludentes da ilicitude do aborto previstos no Codigo Penal ferem os tratados internacionais subscritos pelo governo brasileiro, no entanto a descriminalização do aborto desrespeita o Pacto da Costa Rica, que reconhece o direito à vida desde a concepção, este sim, compromisso humanitário.
O texto do conselho tenta fundamentar o aborto como ato eticamente aceitável, apoiando-se no principialismo, modelo bioético centrado na autonomia, beneficência, não maleficência e justiça. Porém os princípios alegados são aplicados apenas à mulher em detrimento da criança que deveria ser levada em conta na reflexão bioética, principalmente em relação ao princípio da justiça: não é justo que o vulnerável seja sempre prejudicado por aquele que detém mais poder ou que é mais útil para o mercado. Isto configura uma bioética utilitarista e não principialista.
É inadmissível que o SUS seja usado para a realização do aborto, quando tantos doentes aguardam muitas vezes vários meses por um atendimento cirúrgico ou uma internação. É importante salientar que a mulher que procura o aborto tem a opção de não fazê-lo. É um risco evitável. Deve-se concorrer para que um crime seja cometido em segurança?
É bom lembrar que, embora a mulher possa optar, o feto não tem opção alguma. Estamos comparando dois valores de pesos diferentes: vida versus interesses. No caso da mulher o que conta são interesses, mas o feto perde sempre a vida.
Alegar que a pobreza justifica o aborto é uma eugenia social para com o pobre. A pobreza tem que ser encarada com seriedade através de políticas públicas efetivas, mas isto, embora seja ético e eficaz, demanda um custo financeiro alto. Propor o aborto como solução para a pobreza tem por único objetivo despender poucos recursos financeiros: neste caso, para o pobre a solução proposta é a morte.
O último parágrafo do texto do CFM mostra toda a incoerência do posicionamento. Diz o texto: “Finalmente, na esfera jurídica, entende-se que a proposta de alteração do Código Penal estabelecida no PLS 236/2012 – NÃO IRÁ DESCRIMINALIZAR O ABORTO. A conclusão dos Conselhos de Medicina é de que com a aprovação desse projeto o crime de aborto continuará a existir”. O Conselho admite que é crime e se o faz é porque admite que o ser em gestação é uma vida humana que merece ser protegida. Ainda assim, fere o código de ética permitindo ao médico desrespeitar essa vida e nega estar propondo a descriminalização.
É deveras triste que aqueles que juraram defender a vida e a postura ética, sejam os que usam do poder de seu título para confundir a opinião pública e legitimar o assassinato deliberado, apoiados em argumentos pseudoéticos.
Que não nos esqueçamos de que em passado não muito distante os cientistas legitimaram, apoiados em uma falsa ciência, a eugenia, atrocidades como as que foram cometidas no nazismo, utilizando-se do mesmo expediente: determinando que algumas pessoas são menos humanas que outras.
MARIA EMILIA DE OLIVEIRA SCHPALLIR SILVA
Médica Especialista em bioética pela FMUSP
Mestranda em bioética pelo Centro Universitário São Camilo
Membro da Comissão de Bioética da CNBB
ISABELLA MANTOVANI GOMES DIAS DE OLIVEIRA
Dentista, Especialista em Bioética, Especialista em Saúde Coletiva e em Estratégia de Saúde da Família
MARIO DE OLIVEIRA
FÁBIO HENRIQUE PRADO DE TOLEDO
Juiz de Direito em Campinas e Especialista em Matrimonio e Educação Familiar pela Universitat Internacional de Catalunya – UIC
ANDRÉ GONÇALVES FERNANDES
Juiz de Direito 2ª Vara Cível e de Família da Comarca de Sumaré e Professor
APARECIDO DE CAMPOS FILHO
Vereador, Presidente da Câmara Municipal de Campinas – SP
ADELICE LEITE DE GODOY D’ÁVILA
Engenheira Química
Membro do Serviço de Acolhimento à Gravidez Indesejada
FÁTIMA SCHNEIDER
Contadora e Bacharel em Ciências Religiosas pela PUC- Campinas
FÁTIMA CAMPOS
Pedagoga
ANDRÉ MISIARA
Comunidade Sal e Luz – Campinas – SP
JORGE SCHNEIDER
Vereador, Presidente do PTB em Campinas, Membro da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara Municipal de Campinas – SP
DIÁCONO JOÃO VICENTE DA SILVA
Doutor em Odontologia, Professor Titular da PUC-Campinas
Coordenador da Comissão de Bioética e Defesa da Vida da Arquidiocese de Campinas