A festa da Páscoa está, de algum modo, no centro e no vértice do Ano Jubilar da Misericórdia. Ela afirma que Deus, levando às últimas consequências o seu amor sem medida, suporta a tortura e a morte, mas não deixa de amar até o extremo. O que salva a humanidade não é exatamente a cruz, mas o amor demostrado na cruz. Amor que antes foi descrito em palavras, em parábolas, foi mostrado em gestos de compaixão, de proximidade, de acolhida, de intransigência na proteção do pequeno e do fraco, amor que se esquece de si, que suporta ofensa, perdoa, só falta a última e decisiva prova: morrer para manter-se fiel ao amor. É o gesto que valida todas as palavras anteriores, os ensinamentos e os exemplos. A cruz é o sinal e o exemplo, o caminho e a garantia de que a infinita misericórdia cura a nossa enfermidade, devolve a esperança, comunica vida plena. Pascoa é o máximo da misericórdia divina, é o perdão e a vida oferecida a quem o leva à morte. A Pascoa faz novas todas as coisas. Faz da morte vida, da cruz ressurreição, do fracasso a plena vitória. Páscoa é Deus de misericórdia que mostra o seu rosto, e basta contemplar seu rosto com coragem para vermos o nosso interior se transformar.
O Papa Francisco, desde que chegou ao pontificado não cessa de surpreender o mundo com seus ensinamentos de cândida simplicidade e vigorosa profecia. E não chega a ser uma surpresa a escolha que fez do tema da misericórdia para o Ano Santo extraordinário. Ao contrário o tema é uma espécie de resumo vivo de seu ministério e de seu programa de governo, um retrato de sua pessoa, que tanto bem tem feito à Igreja. Desde os primeiros sinais, entrevistas, homilias, passando por seus grandes escritos como a Evangelii Gaudium e a Laudato Si, até o último livro de entrevistas que traz como título “o nome de Deus é Misericórdia”, parece que já estávamos vivendo, com o Papa Francisco, não um ano, mas uma nova Igreja misericordiosa. Seus temas preferidos como a cultura do encontro e da proximidade, a Igreja em saída, Igreja-mãe, de coração aberto a todos, que abraça a todos, que cuida de todos, não importa a religião ou o tamanho do pecado. Igreja “hospital de campanha” a socorrer os feridos do mundo, são todos expressões da mesma misericórdia que devemos traduzir para a nossa vida pessoal, familiar e comunitária.
Para o papa Francisco, que se define como um pecador a quem Deus olhou com misericórdia – e este é o seu lema episcopal – a misericórdia é o núcleo central da mensagem evangélica. “Este amor de misericórdia ilumina também o rosto da Igreja e se manifesta, seja pelos sacramentos, em especial o da reconciliação, seja pelas obras de caridade, comunitárias e individuais. Tudo o que a Igreja diz e faz manifesta a misericórdia que Deus nutre pela humanidade”. (O nome de Deus é Misericórdia, entrevista ao Jornalista A. Tornielli, p.36)
Como viver então a Paixão e a Ressurreição do Senhor à luz do Ano Santo da Misericórdia? Deixando-se tocar. Deixando-se reconciliar, pelo sacramento e pela prática do perdão. Não fazendo conta de si para oferecer-se aos irmãos. Oferecendo a reconciliação de forma generosa. Organizando na comunidade e praticando, também individualmente, as obras de misericórdia corporais e espirituais. Convidando a família, os amigos e mesmo os inimigos, se houver, para o convívio da misericórdia do Senhor. Teremos assim uma feliz e santa Páscoa.
(CNPF com diocese de Osasco)
Dom João Bosco Barbosa
Bispo de Osaco (SP) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB.