Carta do 13º Encontro Nacional de Presbíteros
Estimado Irmão Presbítero!
1. Itaici – Indaiatuba (SP) –, local emblemático para a Igreja no Brasil, transformou-se de 03 a 09 de fevereiro de 2010, num grande cenáculo com 461 presbíteros vindos das Dioceses do Brasil, vários bispos e convidados, para celebrar o Jubileu de Prata de nossos Encontros Nacionais de Presbíteros, no contexto do Ano Sacerdotal, por ocasião do sesquicentenário da páscoa definitiva de São João Maria Vianney, o Cura d’Ars. É o 13º ENP com o lema místico e significativo para todos os que querem ser seguidores do Mestre: “Eu me consagro por eles” (Jo 17,19a). Nessa perspectiva de consagração, quisemos celebrar e fortalecer nossa comunhão presbiteral.
2. Às vezes, caro irmão, tem-se a impressão de que tudo já foi dito e, por isso, nossos Encontros Nacionais podem não apresentar o mesmo elã dos anteriores. O 13º ENP, porém, nos deu a alegria de percebermos o quanto podemos nos fortalecer entre nós presbíteros e, sobretudo, na missão eclesial, em profunda comunhão com nossos irmãos(ãs) leigos(as), com nossos pastores e com o sucessor de Pedro.
3. Nesses encontros nacionais, vivemos a oportunidade única de contemplar, em tempo e espaço tão curtos, uma variedade imensa do ser presbítero da Igreja no Brasil. No primeiro, éramos delegados de 13 mil presbíteros e, nesse 13º ENP, representamos mais de 20 mil irmãos de ministério, espalhados pelo nosso querido Brasil. Irmãos nossos que gastam até duas horas de barco para atender uma das comunidades mais próximas de sua paróquia; outros que vivem imersos na complexidade dos grandes centros urbanos, nas suas sofridas periferias; muitos estão em pequenas cidades do interior desse país-continente; há também os que se dedicam à formação dos novos presbíteros ou ao mundo acadêmico; cresce o número dos padres afrodescendentes e de origem indígena. Constata-se um número sempre maior de irmãos padres que se dedicam ao mundo da comunicação e às coordenações pastorais. Enfim, a identidade do presbítero, hoje, passa pela multiforme maneira de exercer o ministério, nas mais diversas realidades.
4. Fazendo memória dos 25 anos dos ENPs, lembramo-nos dos temas transversais que nos desafiam e perpassam esse quarto de século de nossa caminhada: discernimento a partir da realidade, prioridade da evangelização, modelos de Igreja, orientação do magistério, identidade presbiteral, novo estatuto social do sacerdote, o ministério específico, a mística e a espiritualidade e a missão. Nesse 13º ENP, ajudados pelo nosso irmão Pe. Paulo Suess, sentimos, na ótica da Conferência de Aparecida, o apelo a abrir nossas paróquias à missionariedade, saindo de uma teologia da metafísica rumo à teologia trinitária da relação, harmonizando pluralidade e unidade, na perspectiva da contraculturalidade do evangelho e do resgate da profecia.
5. O assessor nos ajudou a perceber como podemos nos tornar presas fáceis do processo de aceleração imposto pela mentalidade neoliberal. Tudo se apresenta como tão urgente que terminamos por não discernir o que realmente tem urgência. E, nesse mesmo espírito neoliberal, somos tentados a mergulhar num processo de consumismo e de acumulação sem sentido que, além de esvaziar o núcleo humano de todos nós, termina por afetar todo o ecossistema. Fomos, durante nosso encontro, desafiados a buscar o essencial da missão para, com coragem e profetismo, desencadearmos, entre nós, um real despojamento de tudo o que é supérfluo e que fomos agregando na vivência de nosso ministério.
6. No 13º ENP, emergiu ainda o anseio de definirmos melhor nossa identidade de presbíteros, no prisma do sacerdote elementar que, segundo Pe. Paulo Suess, é, hoje, mais necessário que o dotado de dons extraordinários. O sacerdote elementar é o presbítero do bom senso, teologicamente perspicaz, bem informado e inteiro; livre no acolhimento de sua vocação e no seguimento de Jesus Messias; contemporâneo com o povo que carrega um fardo pesado e com todos que buscam um sentido na vida; traz consigo uma eclesiologia da missão que o faz ir ao encontro das pessoas. É o presbítero que fundamenta sua relação e vivência com o povo no seu encontro pessoal com Cristo missionário. É o homem de vivência eucarística e de comunhão eclesial, que entrega sua vida, sobretudo aos pobres e oprimidos, sabendo que só Deus basta, vivenciando, assim, o primado da graça.
7. Por meio do Pe. Joel Portella, percebemos ainda que a aceleração e a acumulação fazem parte da construção de um novo ethos, engendrado na cultura atual de mudança de época, que recompõe a hierarquia dos principais elementos que constituem e interpelam a vida. Tal recomposição na pós-modernidade, afirmou o Pe. Joel Portellla, gira em torno do papel que se atribui ao sujeito individual, como base para um novo pensar, sentir e agir. A exacerbação do individual, própria de uma subjetividade fechada, só será enfrentada pela força do valor evangélico da gratuidade. Gratuidade como marca de um estilo de vida e de novas relações humanas. Nessa perspectiva, fomos interpelados a construir um novo ethos, conscientes de que, nessa mudança de época, a Igreja tem seu lugar social mudado, como também mudou o lugar social do presbítero. Mas, nada de ficarmos lamentando o lugar mudado ou perdido, pois importa reconhecer que as mudanças de época são períodos profundamente libertadores para a construção do Reino.
8. De maneira muito madura, os presbíteros vêm percebendo o quanto é atual a afirmação do Papa João Paulo II: “O ministério ordenado tem uma radical forma comunitária e pode apenas ser assumido como obra coletiva” (PDV 17). Nesse sentido, o 13º ENP fortaleceu, em nós, a convicção de voltar às Igrejas Particulares com a missão de dinamizar a pastoral presbiteral. Vimos, com alegria, que ela cresce e se organiza, cada vez mais, por todo o território nacional, com belos exemplos de solidariedade, principalmente em relação aos presbíteros idosos, jovens e aqueles que assumem paróquias mais pobres e distantes. Essa pastoral vem se constituindo num instrumento valioso de comunhão presbiteral e predispondo os padres para um mais fecundo exercício do pastoreio. O padre bem integrado no presbitério enfrenta com audácia e alegria os desafios da missão, pois sabe que não está só. O Decreto Conciliar Presbiterorum Ordinis centra na caridade pastoral o ministério presbiteral, por isso, ela se configura a alma e a forma da pastoral presbiteral (cf. DAp 70). Essa caridade pastoral é o eixo para o agir do presbítero, que se torna, por meio dela, instrumento do Espírito na história e, a exemplo de Jesus, homem consagrado ao povo que lhe é confiado. É a caridade pastoral a maneira proposta pela Igreja aos presbíteros para a sua missão de anunciadores do Reino.
9. O 13º ENP também foi marcado pelo espírito das palavras do Papa Bento XVI que nos convoca a um encontro pessoal com Cristo. Afirma o Santo Padre que ser cristão não se reduz a uma decisão ética ou adesão a uma grande ideia, mas através do encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá novo horizonte à vida e, com isso, uma orientação decisiva. E Aparecida nos lembra que a própria natureza do cristianismo consiste em reconhecer a presença de Jesus Cristo e segui-lo (cf. DAp 243-244). Tudo isso ganha um sentido ainda mais contundente para nós que fomos chamados a viver o ser cristão de forma radical, como ministros ordenados.
10. Percebemos, com a ajuda do Pe. Estevão Raschietti, que ser missionário passa pelo insubstituível tempo de discipulado junto do Mestre, pois não anunciamos conceitos, mas uma Pessoa, que se fez Carne e habitou entre nós, com a qual precisamos nos encontrar ao longo de toda a nossa existência. Comunhão e missão se tornam, nesse contexto, o binômio por excelência para a vida e ministério de todos os presbíteros, convidados a estarem sempre disponíveis para ir ao encontro das pessoas afastadas e comunidades distantes. Essa missão se faz desafiadora no seu contexto próprio ad gentes, nos difíceis ambientes das grandes metrópoles e em outras regiões. Mereceu grande destaque entre nós o desafio missionário na Amazônia, da qual muito se fala e pouco se conhece. Nesse sentido, foi feito um grande apelo para uma presença mais significativa dos presbíteros de outras regiões do país junto ao povo amazônida.
11. Tudo o que se ouviu foi rezado, meditado e contemplado nos vários momentos celebrativos e no retiro espiritual, orientado pelo Cardeal D. Odilo Pedro Scherer. Tempos de profunda vivência do mistério da comunhão com Jesus Cristo e com toda a Igreja, sobretudo na Eucaristia, onde a memória de nosso compromisso ministerial se fazia presente em cada prece e em cada canto, chamando-nos a viver decididamente como presbíteros animadores das comunidades de discípulos-missionários. Em outros momentos, tais como nas oficinas, plenários e trabalhos de grupo, os temas foram também debatidos.
12. Recebemos inúmeras mensagens de irmãos e irmãs que nos acompanharam por meio de orações e dentre elas destacamos a de Dom Paulo Evaristo Arns, Arcebispo emérito de São Paulo, de Dom Pedro Casaldáliga, Bispo emérito de São Félix do Araguaia, de Dom Alberto Taveira, Arcebispo eleito de Belém, do Departamento Vocações e Ministérios do CELAM e de Dom Cláudio Hummes, Prefeito da Congregação para o Clero. Dom Cláudio, em sua mensagem, nos lembrou repetidas vezes de que os presbíteros devem ser homens de oração e o fez com veemência, afirmando: “Não nos iludamos: se falta a oração pessoal na vida do presbítero, sua ação pastoral será estéril e correrá o risco de perder de vista o “primeiro Amor”, ao qual entregou incondicionalmente sua vida, naquele dia memorável e cheio de generosidade, o dia da sua ordenação sacerdotal.”
13. Caro irmão, para reforçar nossa alegria no seguimento de Jesus Cristo, nos fizemos romeiros e, reunidos na Eucaristia, entusiasticamente presidida por Dom Geraldo Lyrio Rocha, presidente da CNBB, no Santuário Nacional de Aparecida, pusemo-nos sob o manto de Nossa Mãe para nos comprometermos com seu Filho, construindo um novo ethos, com bases sólidas na profecia e gratuidade, sabendo que a fé cristológica traz implícita a opção preferencial pelos pobres, como tão bem nos lembrou o Papa Bento XVI. Da celebração do 13º ENP saímos mais convictos de que a nossa configuração a Cristo, Bom Pastor, permite-nos somar a nossa vida a d’Ele e dizer: “Eu me consagro por eles”.
Presbíteros participantes do 13º ENP
Para refletir com o presbítério:
1. Como abrir nossas paróquias à missionariedade?
2. Quais as principais iniciativas de nossa Diocese no âmbito da pastoral presbiteral?
3. Qual a importância desse ano sacerdotal para nós e todo o povo de Deus?
4. Quais são os elementos constitutivos do sacerdócio elementar? Por quê?