Teve início nesta terça-feira, 26, a primeira da série de três audiências públicas sobre a descriminalização do aborto de fetos anencéfalos, discussão que faz parte da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 54, de iniciativa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello. As audiências têm por objetivo esclarecer as dúvidas referentes ao aborto de fetos anencéfalos (sem cérebro). O STF ouviu cinco especialistas sobre o assunto, entre juristas, feministas, médicos e entidades religiosas.
O assessor da Comissão para a Vida e a Família da CNBB e doutor em Bioética, padre Luiz Antônio Bento, foi o primeiro especialista a se pronunciar. Ele reafirmou a posição da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que defende o direito à vida do feto humano, independente de ter anomalia ou não. Segundo padre Bento, o descumprimento desse preceito fere a dignidade humana. “Não se constrói uma sociedade contra inocentes. Se não respeitamos essa fase da vida, certamente não serão respeitadas as seguintes”, afirmou. O especialista destacou, também, o dever da sociedade e, principalmente, da saúde pública de cuidar da vida humana e da mãe que está grávida de um feto anencéfalo. “Não podemos descartar uma vida que está no ventre materno. Não é através do aborto que a mãe vai se sentir bem. Nós defendemos que a prevenção por meio da medicina, da psicologia é o melhor caminho para a vida do feto e da mãe”, argumentou.
O jurista Paulo Silveira Martins Leão, defensor do desenvolvimento de fetos anencéfalos, também representou a CNBB na audiência. Para ele a vida é mais importante do que qualquer outro argumento em favor do aborto de fetos anencéfalos. Leão discordou quando o representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde, o advogado Luis Roberto Barroso, afirmou que o feto, por não ter consciência já nasce morto ou tem 100% de chance de viver alguns minutos ou alguns dias. “Anencefalia não equivale à morte do anencéfalo. Seria necessário que a ciência provasse isso”. O representante da Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família, o médico Rodolfo Acatauassú Nunes, tem a mesma posição. “A ciência ainda não tem condições de provar que o feto anencéfalo não tem consciência, mas temos um exemplo concreto. A menina Marcela de Jesus Ferreira, que viveu um ano e oito meses, correspondia aos cuidados de sua mãe Cacilda Ferreira. Quando ela se ausentava, a criança chorava. Em contato com a mãe as reações eram positivas”, sublinhou.
Testemunho de Cacilda Ferreira
No intervalo da sessão, Cacilda Ferreira, mãe da menina Marcela, falou aos jornalistas sobre o comportamento de sua filha falecida recentemente. “A Marcela sentia minha falta, não ficava com ninguém. Até meu marido ficava pouco tempo com ela no colo. Nunca passou na minha cabeça de interromper a gravidez”. Cacilda, emocionada, recordou os cuidados com Marcela. “Não foi difícil cuidar dela. Marcela foi um presente de Deus. Uma criança mais que especial que precisa de muito cuidado, amor e carinho”.
A segunda audiência acontece na próxima quinta-feira, 28, e a última será no próximo dia 4 de setembro.