O livro “Família no debate cultural e político contemporâneo” é uma produção de dom João Carlos Petrini, bispo de Camaçari (BA) e presidente da Comissão Episcopal para a Vida e a Família da CNBB, e de Marcelo Couto Dias, docente e mestre em Família na Sociedade Contemporânea. Trata-se de uma abordagem atual sobre a família, com uma visão crítica e especializada do assunto, destinada a formação dos agentes de pastorais, aos casais, lideranças e demais interessados no tema.
A obra apresenta importantes reflexões sobre a realidade da família, com as temáticas “Família em contexto de mudança social”, “Família, recurso para a pessoa e para a sociedade”, “Família e vulnerabilidade”, “Políticas familiares”. Traz, também, outros assuntos como políticas públicas, educação, projeto de vida, cidadania, ecologia, união de pessoas do mesmo sexo, Estado laico; todos direcionados ao papel da família.
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Confira abaixo, o texto de introdução do livro:
“Uma sondagem de opinião, realizada em 2007 por um prestigioso instituto paulista, revelou que 98% das pessoas entrevistadas consideram a família importante ou muito importante. Dificilmente os observadores do cenário cultural brasileiro, a partir do que aparece nos meios de comunicação e nas publicações especializadas, poderiam prever que a família gozasse de tanta aceitação junto à opinião pública.
O fato de ter sido escolhida pelo Governo, como parceira para implementar políticas sociais de combate à pobreza e à evasão escolar, indica outra vertente desta valorização da família. Alguém poderia afirmar: nunca a família foi tão valorizada como nestes últimos tempos.
Por outro lado, os meios de comunicação, leis e projetos de lei , decisões do STF , assim como algumas publicações acadêmicas consideram família qualquer convivência debaixo do mesmo teto, sem outras especificações além da existência de algum tipo de afetividade que ligue aquelas pessoas entre si. Nesse sentido, alguém poderia ponderar: nunca a família foi considerada de maneira tão fluida, com contornos tão indefinidos, sendo diluída a sua identidade a ponto poder desaparecer como grupo social / instituição com características próprias bem delineadas.
Esta situação paradoxal segundo a qual ora a família é tudo, ora é nada, documenta quão profundo é o processo de mudança que envolve a sociedade brasileira. Todavia, na pluralidade de postura, nestes últimos anos amplia-se o consenso de que a família não somente constitui uma rede de solidariedade necessária para favorecer a inclusão social das novas gerações a formas positivas de crescimento e de inserção no contexto social, mas é fundamental também para encontrar o caminho da paz social.
Vai-se delineando uma concepção de homem e de mulher (de paternidade e de maternidade, de sexualidade e de amor) radicalmente diferente daquela que está na base da civilização ocidental e que tem, no legado filosófico e jurídico greco-romano e na tradição judaico-cristã, seus pontos de referência. O que está em questão não é alguma regra de moral, por exemplo, a possibilidade de tomar a pílula ou divorciar-se, como se debatia nos anos 60 e 70. Constrói-se um horizonte antropológico alternativo, que configura uma verdadeira mutação antropológica. No fundo, delineiam-se dois horizontes distintos: de um lado, o significado e a realização da vida são buscados no amor, vivido como dom de si até o sacrifício próprio para o bem de outros e, do outro, espera-se a felicidade graças à consecução do bem estar individual até o sacrifício de outros, mesmo inocentes. Dois universos axiológicos convivem e se conflitam no coração e nas mentes das pessoas e das famílias.
Não é nova esta dupla maneira de considerar a família. Já Platão pensava que a família era fonte de desigualdades e de egoísmos e por isso deveria ser eliminada. No polo oposto, Aristóteles considerava a família uma realidade natural, o lugar no qual se aprendem e se exercitam importantes virtudes humanas, que irão beneficiar a inteira Polis. Cicero, na idade de ouro do império romano, considerava a família como “seminárium rei publicae”, que em tradução livre pode ser entendido como: “viveiro de cidadania”.
Em época mais recente, entre o século XVII e XVIII, grupos de protestantes europeus que emigraram no Norte da América, constituíram as “comunas”, na tentativa de estabelecer relações humanas e afetivas sem a constituição de vínculos familiares. No século XIX e ainda durante a revolução soviética, diversos movimentos socialistas foram na mesma direção, bem como na primeira metade do século passado, em Israel os kibbutzim e, mais tarde, as “comunas” dos hippies fizeram semelhantes tentativas.
Atualmente, uma difusa cultura da negação e da suspeita vê a família como disfuncional ao desenvolvimento social, obstáculo ao progresso e reduz a família a um agregado de indivíduos. Afirma Donati: isto acontece porque “a modernidade organiza a ordem social ao redor do eixo indivíduo-Estado.” (…) Os assim ditos corpos intermediários são vistos com suspeita, enquanto vínculos para os indivíduos e enquanto poderes “alternativos” ao Estado.” Além disso, a modernidade confere prioridade ao código simbólico do mercado, como paradigma constitutivo da esfera pública, como motor da cultura. Dessa maneira, não é previsto um lugar específico para a família no espaço político e seu código simbólico é reinterpretado através do código do mercado. “.