A União dos Juristas Católicos (UJUCARJ) foi instada a se manifestar sobre o Projeto de Lei n° 5.003-B, de 2001, (aprovado na Câmara dos Deputados em turno único de discussão em 23 de novembro de 2006) que altera a Lei n° 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, dá nova redação a dispositivos do Código Penal (Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940) e da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, (Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943). O Projeto de Lei em questão foi encaminhado para exame e votação do Senado Federal, (onde recebeu o nº PLC 00122/2006) encontrando-se atualmente na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, onde já foram realizadas audiências públicas, a primeira das quais, em 23 de maio de 2007, contando com a participação do Presidente da UJUCARJ, que expôs o pensamento desta associação sobre a matéria, conforme manifestação de 13 de março de 2007, da lavra dos integrantes de grupo de trabalho específico (vide texto integral no site http://www.jurstascatolicosrj.org)
A presente manifestação objetiva complementar e desenvolver alguns aspectos já abordados, ao menos implicitamente, na manifestação de 13 de março de 2007, fazendo parte integrante e inseparável daquela, cuja leitura se faz necessária para a plena compreensão desta.
Toda a pessoa, em razão de sua própria natureza e dignidade humana, deve ser respeitada e salvaguardada de agressões, inclusive a que adota práticas e atitudes sexuais que sejam consideradas impróprias e inadequadas por parcela maior ou menor da sociedade.
No entanto, percebe-se estar subjacente ao projeto de lei em exame (PL 5.003-B, na Câmara dos Deputados e PLC nº 00122/2006, no Senado Federal) um “preconceito ideológico”, radical e intolerante, no sentido de não admitir posicionamentos éticos (e atitudes correspondentes) em matéria relativa a comportamento sexual, que não aquele adotado, de modo ambíguo e passível de não poucos questionamentos, como paradigma pelo referido projeto de lei.
Resulta daí ao nosso ver, inconstitucionalidade por desrespeito à liberdade de crença, de religião, de educação e formação dos filhos conforme as convicções pessoais dos pais e familiares. As maiores religiões do mundo, em ordem cronológica de sua manifestação histórica, o judaísmo, o cristianismo e o islamismo, fortemente presentes em nossa nação, com os conseqüentes desdobramentos culturais e éticos, contêm normas variadas sobre quais sejam os comportamentos e condutas sexuais que se reputa corretos e adequados. O projeto de lei em exame parece querer impor, em matéria de comportamento sexual, a adoção de critérios éticos diversos dos adotados por antiga tradição ética, cultural e familiar nacional.
Por exemplo, a prática da homossexualidade, masculina e/ou feminina e da bissexualidade, são tradicionalmente, em nossa cultura, tidos como comportamentos e atitudes em matéria sexual, impróprios, inadequados e indesejáveis, tanto sob o ponto de vista individual, quanto familiar e social.
A grande maioria da sociedade brasileira, certamente, não iria desejar para um filho, uma filha, ou um familiar próximo, qualquer desses comportamentos, os quais tendem naturalmente a expandir-se conforme sejam estimulados.
O Projeto de Lei em questão conquanto utilizando termos e expressões ambíguas e imprecisas, parece considerar determinados comportamentos em matéria sexual, tais como os referidos, que refogem ao padrão ético e moral da maioria do povo brasileiro, como privilegiados em termos de tratamento jurídico. Até mesmo aberrações, como a pedofilia e o bestialismo, poderiam, em tese, estar incluídas, por exemplo, na vaga expressão “orientação sexual”, utilizada no projeto de lei em foco para tipificação penal e punitiva.
Ademais, data maxima venia, parece não haver qualquer fundamento plausível de razoabilidade, em considerar tais comportamentos sexuais, questionáveis eticamente para a maioria da população, equiparáveis a raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (vide Lei 7.716/1989). Termos esses últimos que importam em conceitos razoavelmente definidos e sedimentados e em relação aos quais há uma consciência inerente aos valores democráticos de pluralidade, do não cabimento de discriminação em razão dos mesmos.
A maioria da população brasileira certamente se oporia em ser constrangida ou proibida, por medidas punitivas penais (restritivas de liberdade), profissionais, cíveis, empresariais e tributárias, de expressar seu pensamento em matéria sexual e de adotar as posturas correspondentes (respeitada a dignidade das pessoas envolvidas) no âmbito familiar, profissional e social.
Termos e expressões não sedimentados no vernáculo, na língua portuguesa, e mesmo em âmbito filosófico, no sentido que parece pretender atribuir-lhes o projeto de lei em exame, tais como “gênero”, “identidade de gênero” e “orientação sexual”, têm alto teor de conteúdo de abstração e ambigüidade, e, pois, de imprecisão quanto ao seu conteúdo e alcance. Permitem, ao menos em tese, a abrangência de todo tipo de comportamento sexual, não só a homossexualidade e bissexualidade, mas também, situações extremas, como por exemplo, a pedofilia e quaisquer tipos de promiscuidade. Quem criticasse tais práticas estaria sujeito a terríveis punições, criminais cíveis, profissionais (perda de cargo ou função pública), empresariais e administrativas.
A matéria deveria ser objeto de profunda reflexão, com muito maior participação da sociedade, com divulgação ampla pelos meios de comunicação da integralidade do conteúdo do projeto de lei em análise, o que infelizmente não vem ocorrendo. Jamais deveria ser desrespeitada a liberdade de opinião, de crença, livre expressão (art. 5º, IV, VI e VIII) e comportamentos correspondentes (sempre respeitada a dignidade da pessoa humana) dos que são contrários por quaisquer motivos, morais, religiosos, culturais, etc. , às referidas práticas e atitudes sexuais
Importa destacar que o projeto de lei em exame, caso aprovado, poderia estar criando uma espécie privilegiada de cidadãos, em razão de prática ou comportamento sexual diversos, convém reiterar, dos que são usualmente seguidos pela grande maioria da população brasileira. Esta poderia, no tema, tornar-se como que refém e passível de opressão por uma minoria, que, a qualquer momento, poderia alegar suposto preconceito ou discriminação (em razão de prática e atitude sexual que se reprovasse) para fins de aplicação dos dispositivos do projeto de lei em análise, com trágicas e inteiramente desproporcionais conseqüências para sua vida pessoal, profissional e familiar.
Há de se reconhecer a todos os direitos decorrentes da dignidade da pessoa humana, mas parece não haver fundamento para privilegiar comportamentos sexuais dissonantes do padrão social usualmente aceito, com graves e inadmissíveis restrições à liberdade de crença, opinião e correspondentes atitudes dos demais.
Concluindo, entendemos que agressões contra pessoas, em quaisquer situações de efetiva vulnerabilidade, como a decorrente de idade avançada, por exemplo, devem ser disciplinadas no campo próprio do direito penal. E que isso não importe em discriminações contra os demais, prevendo-se as hipóteses em que, conforme as circunstâncias do delito, deva haver o agravamento da pena.
Rio de Janeiro, 7 de abril de 2008.
UNIÃO DOS JURISTAS CATÓLICOS DO RIO DE JANEIRO –
UJUCARJ
FRANCISCO MASSÁ FILHO
JOSÉ AFONSO BARRETO DE MACEDO
LUISA CRISTINA BOTTREL SOUZA
LUIZ FELIPE HADDAD
PAULO SILVEIRA MARTINS LEÃO JUNIOR