Realizada entre os dias 1º e 7 de outubro, em todos os Regionais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Semana Nacional da Vida, foi uma oportunidade para os cristãos refletirem, em suas dioceses, sobre a importância de defender e promover a vida. No período, as comunidades de base desenvolveram atividades e encontros, sugeridos pelo subsídio “Hora da Vida”, para trabalhar e refletir sobre o tema “Vida, saúde e dignidade humana: direito e responsabilidade de todos”.
Em entrevista, o arcebispo de Aparecida (SP) e presidente da CNBB, cardeal Raymundo Damasceno, trata da importância da Semana Nacional da Vida e outras questões ligadas ao direito à vida e à preservação da dignidade humana.
Leia a entrevista:
1. Qual a importância de um evento como a Semana Nacional da Vida para o Brasil?
A Semana Nacional da Vida é, com certeza, uma ocasião propícia para a realização de atividades em âmbito eclesial, familiar e social que suscitam a reflexão, o diálogo e a celebração em torno da questão da acolhida, do respeito, do cuidado, da promoção e da defesa da vida desde a sua concepção até o seu fim natural.
2. Como o senhor analisa o tratamento que a sociedade dá, atualmente, às questões da vida?
O povo brasileiro é um povo apaixonado pela vida, alegre, esperançoso, corajoso, batalhador. No entanto, no coração do homem, infelizmente, a maldade encontra abrigo. Convivemos com altos índices de violência, desde a negação do direito à vida de um ser humano frágil, ainda em gestação, até o descaso com as crianças, as populações vulneráveis e os doentes. A lógica utilitarista, consumista e hedonista das sociedades pós-modernas avaliam a vida sob a ótica de sua utilidade e não como um valor em si mesmo.
3. De que forma a Igreja pode promover e defender a vida? Quais são as ações já realizadas nesse sentido?
Poder-se-ia afirmar que o papel da Igreja, antes de tudo, é pedagógico. A Igreja, como presença do Senhor da Vida na sociedade, formada por vários membros e presente em todos os ambientes, se esforça por transmitir uma educação para a vida através da compreensão e da promoção do valor perene da dignidade de cada ser humano, que é concebido, que se desenvolve, que constitui família, que trabalha, que adoece e envelhece. Ademais, a Igreja não cessa de anunciar que a pessoa possui uma vocação que vai além da vida presente, e, por isso, é testemunha da esperança.
4. Qual o objetivo de instituir uma data como o Dia do Nascituro?
Nesta data, celebramos o início de toda vida humana. Não haveria o ser humano se ele antes não tivesse passado pela fase da gestação. A palavra “nascituro” designa aquela criança que ainda está se desenvolvendo no seio materno. Quando uma mulher almeja ter filhos e quando se percebe grávida, faz tudo para proteger e acolher aquela nova vida. Nosso ordenamento jurídico afirma, justamente, que esta vida tem o direito de ser salvaguardada. Continuar alimentado esta consciência na Igreja, na família e na sociedade é dever de todos nós.
5. Como o senhor avalia a atenção que o Estado dá às questões da vida?
O Estado, através da participação social, inclusive da própria Igreja, deu significativos passos quanto à atenção às questões do direito à dignidade de vida em todas as suas fases, idades e situações existentes no seio da sociedade brasileira. Todavia, muito ainda resta a se fazer. A qualidade de vida que todos nós almejamos não se resume à melhora do poder aquisitivo e ao acesso aos bens de consumo. Ela significa sobretudo ter as condições necessárias para que as relações humanas permitam a realização de cada pessoa no dom de si mesma para o comprometimento com o outro, em particular no seio de uma família, célula primeira da sociedade brasileira.
6. Que tipo de ajustes a legislação necessita para, de fato, promover e defender a vida?
Há de se ter o cuidado em querer fazer ajustes precipitados na legislação brasileira, pois isso pode acabar comprometendo a verdadeira promoção e a real defesa da vida. Exemplo disso são algumas propostas do anteprojeto de reforma do Código Penal. Nestas propostas temos, por exemplo, a redução da idade de 14 para 12 anos para se considerar que uma criança sofreu o chamado “estupro de vulnerável”. Por outro lado, alguns projetos de lei podem ser instrumentos jurídicos que reforçam a defesa da vida em nossa legislação. Como exemplo disso, temos iniciativas de propostas de leis em nível estadual que explicitam a defesa do nascituro. O mesmo acontece com o Projeto de Lei conhecido como “Estatuto do Nascituro”, já aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara, e para o qual uma coleta de assinatura está sendo feita a nível nacional, inclusive com o apoio do site da Pastoral Familiar do Brasil.