Para nós hoje, o caminho do deserto não é conduzido por Moisés, mas por Cristo. Ele nos convida a sair com ele e, no lugar de uma simples libertação passageira, nos convida a passar pela sua Cruz e chegar à Ressurreição, a verdadeira Páscoa.
A Quaresma deste Ano Santo Jubilar nos convida a uma nova e bela experiência da misericórdia de Deus. É próprio da vida cristã a atitude de contínua conversão, de sair, de colocar-se a caminho, de buscar uma perfeição sempre maior. A cada ano a Igreja nos oferece essa preciosa chance de reviver, na quaresma, a mesma experiência que está na origem do povo de Deus, conforme lemos no livro do Êxodo: a vida do povo hebreu antes farta e abundante, no Egito, havia-se tornado uma pesada escravidão. Deus ouve com misericórdia o lamento do povo e chama Moisés para conduzir seu povo ao deserto, e daí à liberdade. É bem esse o trajeto que fazemos a cada ano na Quaresma: hoje ainda somos pegos pela escravidão da vida material, nos acomodamos ao vicio, à mentira, ao pecado. Olhamos ao redor e percebemos os estragos causados pelo abandono da lei de Deus, pelas falsas soluções do enriquecimento fácil e desonesto, pelo vazio em que nos jogam as crendices e os enganos do mundo. No caminho do Êxodo, o povo reencontra, no Monte Sinai, a Lei de Deus. Faz aliança com Deus. É Ele quem vai conduzir o mesmo povo, após quarenta anos de caminhada, à terra prometida da liberdade e da vida.
Para nós hoje, o caminho do deserto não é conduzido por Moisés, mas por Cristo. Ele nos convida a sair com ele e, no lugar de uma simples libertação passageira, nos convida a passar pela sua Cruz e chegar à Ressurreição, a verdadeira Páscoa. Ele é o novo Monte Sinai, a nova e definitiva Aliança, ele é o rosto da misericórdia de Deus que nos quer libertar.
A Quaresma, a cada ano, nos oferece um tema rico de reflexão e prático no sentido de conversão: neste ano, o tema “Casa Comum, nossa Responsabilidade” poderá ser estudado junto com a belíssima Carta Encíclica do Papa Francisco, a “Laudato Si”. Vale lembrar que os roteiros para os grupos de Família, iniciados como novena de Natal, continuam no 2º volume, com o tema da CF, a Via Sacra, a Celebração Pascal. O 3º volume, para os grupos que perseverarem por todo o ano, será inteiramente sobre o Ano da Misericórdia e as obras que somos chamados a realizar.
O Ano Jubilar, por seu apelo à conversão e reconciliação, pelo riquíssimo tema da Misericórdia, pelo impulso profético do Papa Francisco, tem tudo para estender o êxodo quaresmal para o ano inteiro. Ele nos deve colocar em estado de peregrinação, não só neste período que antecede à Pascoa, mas até o fim do ano. Ao atravessar a Porta Santa, renovamos o compromisso com a Fé. Ao buscar o sacramento da Confissão e da Eucaristia com mais frequência, em comunhão com o Papa e com a Igreja, recebemos a indulgência plenária. Vamos iluminar nossa vida com uma escuta mais atenta da Palavra divina, com a prática da Adoração ao Santíssimo, o rosário em comunidade. É tempo de praticar generosamente o perdão, em família, entre vizinhos, com todos, sem importar o tamanho da ofensa, e praticar obras de misericórdia corporais e espirituais. Sermos misericordiosos como o Pai, é o propósito do Ano Santo.
Atitudes típicas para o Ano Jubilar
As atitudes podem ser vividas individualmente, mas elas ganharão impulso e participação se as paróquias e comunidades, bem como os movimentos e associações cuidarem de organizar ações em conjunto. Veja como:
1. Peregrinações – As peregrinações fazem parte de todo ano jubilar. A Porta Santa, aberta em nossa Catedral de Santo Antônio, em 11 de dezembro deverá ser o sinal visível de uma conversão consciente e profunda dos peregrinos que por ela passarem. Podem ser agendadas as peregrinações junto à catedral, pelas paróquias, comunidades, movimentos, acompanhados por seus assistentes. Importante é que sejam preparadas com antecedência e realizadas com calma, tornando-se um dia agradável de encontro da comunidade com Deus, dia de convivência, de aprendizado, de conversão.
2. Indulgências – Em ocasiões adequadas, seja instruído o povo de Deus a respeito do verdadeiro sentido da indulgência plenária e a maneira de obtê-la. Cuidem que sua compreensão não se reduza ao mágico, ao mercantil ou ingênuo. Sejam divulgadas as condições necessárias para receber as indulgências.
3. O sacramentos – Aos grupos programados para peregrinar até a Porta Santa, pode ser oferecida a oportunidade de confissão e a participação na eucaristia, nos horários previstos pela Catedral. Mas é recomendável que o Sacramento da Reconciliação seja oferecido previamente, na própria comunidade dos peregrinos. Cuidem os padres de cada Região pastoral organizar-se e, juntos, atenderem a esses grupos, em datas previamente conhecidas pelo povo.
4. O Sacramento da ReconciliaçãoÂÂ – Não apenas aos grupos, o Ano da Misericórdia convida aos ministros do perdão que ofereçam o sacramento da Reconciliação até mesmo àqueles que não o procurariam. Juntos, os sacerdotes de uma Região podem programar celebrações do perdão em locais fora da Igreja, onde se encontrem as pessoas, tais como escolas, condomínios, praças e outros locais públicos.
5.Práticas de Piedade – As vigílias de Adoração bem como a Leitura espiritual da Sagrada Escritura, o exercício da Via Sacra, a recitação do Rosário são práticas que acompanham as peregrinações do Ano Santo.
6.Obras de misericórdia – Contempla o pedido de que cada comunidade organize, de forma expressiva, além do que já temos, ao menos uma obra de caridade material ou espiritual, conforme a realidade onde se encontra. Algo que toda a comunidade tenha a graça de participar. Podem ser ações pontuais ou duradouras. Melhores são as que permanecerão depois desde Ano Santo como fruto permanente na comunidade.
7. Atenção às Famílias – Ainda vivemos os reflexos do Sínodo da Família. Saber de que necessitam as famílias, oferecer apoio, minorar os conflitos, mostrar o caminho aos indecisos, pôr-se ao lado dos enlutados, acolher e aconselhar são ações que combinam com a prática da misericórdia. Uma Pastoral da Escuta, organizada numa comunidade ou grupo de comunidades, pode salvar vidas e aproximar famílias de Cristo misericordioso.
8. Água, precioso dom coletivo – A Campanha da Fraternidade nos coloca diante do uso responsável da nossa Casa Comum, especialmente quanto ao uso da água, em tempos de grande escassez. Podemos estender esse propósito a todos os outros aspectos de desperdício que ofendem a Deus Criador e aos irmãos que compartilham os bens da natureza. Como irá chegar ao nosso dia a dia o convite do Papa Francisco de uma ecologia da vida quotidiana, feita de sobriedade e equilíbrio, de uma vida mais simples, onde o prazer da convivência não seja entorpecido pelo desejo sôfrego de consumo, de vantagem sobre os outros, uma vida de honesta partilha e solidariedade?
9. Presença na sociedade – A Campanha da Fraternidade, assim como as atividades do Ano Santo, apelam para uma presença e testemunho cristão também fora do ambiente da Igreja. A Campanha, como neste ano é ecumênica, nos convida a envolver a as outras igrejas cristãs que estiverem dispostas a caminhar em diálogo e colaboração. Juntos devemos continuar a trilha aberta pela Campanha do ano passado, que teve ampla acolhida em ambientes públicos, as audiências nas Câmaras Municipais, as manifestações, a parceria com as autoridades públicas, sem coloração partidária, porém visando o bem da comunidade.
Papa Francisco, o rosto da misericórdia – Recomendo a releitura e o estudo da “Misericordiae Vultus”, a Bula do Papa Francisco que instituiu o Ano Santo. São poucas páginas, mas são alimento sólido para nossa vivência pessoal e comunitária desta extraordinária graça que nos é dada a viver. Nenhuma ação será efetiva, nem no Ano Santo, nem na Campanha da Fraternidade, se não reencontrarmos uma verdadeira paixão por Cristo, que é o rosto da misericórdia do Pai. Sem esse ponto de partida, nossas ações serão fragmentadas e, mais cedo o mais tarde, irão sucumbir e passar, como passam os modismos de cada época. Ele é também o ponto de chegada do nosso êxodo, a nossa Páscoa, a nossa paz plena e duradoura. Feliz Páscoa a todos!
Dom João Bosco, ofm
Bispo de Osasco, SP
Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB